AS PALAVRAS-PEDRA
O cão dos dias passa por dentro das sombras do tempo,
leva na boca pedaços de cérebro, de coração,
devorados entre estrelas de dendrites desfeitas.
O cão dos dias passa, rouba a água às flores,
o silêncio às aves, o dilúvio aos mortos,
a boca às pedras, a pureza aos rios.
O cão dos dias rouba todas as túnicas brancas,
veste-se de negro.
Com as palavras-pedra ferra os olhos húmidos.
E deixa que te enlace, na música da memória.
As aves voam com o vento.
Por dentro das sílabas mortas, os corpos anseiam
o gemido da terra,
nas flores colocadas fora do lugar.
Maria do Sameiro Barroso
CHANCELAS LINGUAGEM DE CÁLCULO - ASSOCIAÇÃO CULTURAL
O poeta Miguel Godinho em Entrevista acerca de "Os Nossos Dias"
Posted by Linguagem de cálculo on sexta-feira, 20 de maio de 2011 · Leave a Comment
Que se pode esperar de "os Nossos Dias", seu livro de estreia?
“Os nossos dias” [editado pela editora 4águas] é um livro de poemas que discorrem basicamente sobre aquilo que julgo ser(em) o(s) sentimento(s) que caracterizam muito da minha geração, a geração que agora tem trinta anos. Uma geração dividida por uma apatia causada pelo vazio deste mundo carregado de estímulos (e cada vez mais virtual) e por aquilo que ficou lá atrás algures no passado e que não volta mais: a juventude perdida, as loucuras adolescentes. É um livro que acontece num momento de transição da “vida” para a “vidinha”. É um livro que assume que o facto de sermos adultos e sérios é uma chatice, por causa da hipocrisia que reina neste mundo “sério” em que vivemos. Sabe, no fundo o que neste livro se diz é que muito do interessante da vida ficou na adolescência, no mundo dos sonhos inocentes. O que se pode esperar deste livro? Talvez um livro negro mas não derrotista, possivelmente não mais que um livro de confronto.
Que caminho foi percorrido até se chegar ao livro?
Desde que lembro, a minha escrita sempre funcionou como uma espécie de auto-terapia. Sempre escrevi para dizer a mim próprio. E, nesse sentido, acho que este livro – os textos que o compõem – foi, como não podia deixar de ser, mais uma tentativa de procura interior, uma tentativa de chegar àquilo que realmente sou, de questionamento daquilo que me faz realmente feliz, uma pesquisa à volta daquilo que fui, daquilo que sou e daquilo que quero ser. Acho que faz falta pensarmo-nos mais, questionarmo-nos, olharmo-nos ao espelho, para que percebamos com mais clareza quem somos. Essa procura pode ser às vezes uma tarefa complicada: podemos depararmo-nos com aquilo que durante muito tempo não quisemos ver. Mas servirá sempre para nos situarmos com mais clareza na realidade em que nos inserimos.
Que autores e estilos são influências?
Há muitos autores que admiro. Gosto bastante de Pessoa, do Peixoto, do Ramos Rosa, do Al Berto, do Herberto Helder, do Gastão Cruz, entre muitos outros. Não há muito tempo descobri o Bukowski, que tem uma escrita com a qual me identifico bastante. É alguém que fala da vida, sem complexos, que sente poesia num género de assuntos que eu também gosto de tratar.
Como é o seu processo criativo? considera ter métodos próprios?
O meu processo criativo consiste simplesmente em andar atento às experiências do dia-a-dia. A minha escrita anda muito á volta do quotidiano, da realidade diária, das experiências diárias e da memória. Do confronto do que acontece no dia-a-dia com a memória, dá-se o choque: é aí que nos situamos na vida. É disso que falam os meus textos. Não tenho métodos próprios. Escrevo o que me apetece, quando me apetece, quando sinto necessidade. Se se considera o facto de estar em casa, no sossego da música que coloco para despoletar o processo de escrita, um método criativo, então esse é o meu método próprio.
Como vê a poesia que se faz actualmente no Algarve?
O Algarve sempre foi uma região que esteve associada à poesia, sempre foi terra de poetas. Aqui nasceram grandes nomes, muitos deles ainda vivos. Mas os maiores poetas algarvios terão vivido na sombra da literatura, sem que tivessem ficado na história. Um poeta não é apenas aquele que escreve poesia. Tenho trinta anos e já conheci grandes poetas que nunca pegaram numa caneta. Sabe, a poesia existe nos olhos de quem a sente e de quem a vive, não na caneta de quem a escreve. Com isto digo que a poesia que se faz actualmente no Algarve é tão interessante quanto aquela que se fazia noutros tempos. Conheço bons poetas actualmente na região. Há também muitos jovens como eu a escrever, o que é bom.
Considera enquadrar-se na "novíssima poesia portuguesa"?
Não. Não quero enquadrar-me na “novíssima poesia portuguesa”. Quero enquadrar-me em mim próprio. Escrevi este livro, como já disse, para me descobrir, para me ler. Queria ouvir de mim o que tenho a dizer sobre mim. Se alguém se identificar com o que aí vai ler, óptimo, pode ser que já tenha sentido algo do género mas nunca tenha sido capaz de o pôr no papel. Senão, passo bem sem isso. Não pretendo nada com este livro, nenhuma espécie de reconhecimento. Quero é conhecer-me um pouco melhor.
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Manuel Madeira e o Livro "À Descoberta das Causas no Sortilégio dos Efeitos"
Posted by Livros do Mundo Editora on quinta-feira, 19 de maio de 2011 · Leave a Comment
Em breve mais detalhes no espaço da nossa chancela editorial Livros do Mundo.
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Quintas de Cultura
Posted by Linguagem de cálculo on segunda-feira, 16 de maio de 2011 · Leave a Comment
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Ramos Rosa: Apresentação em Olhão
Posted by Linguagem de cálculo on segunda-feira, 9 de maio de 2011 · Leave a Comment
Apresentação do livro de António Ramos Rosa, Prosas seguidas de Diálogos por Manuel Madeira, com introdução de Fernando Esteves Pinto.
Projecção do filme de Adão Contreiras sobre António Ramos Rosa.
Biblioteca de Olhão, 11 de Maio, 18h00.
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Fernando Esteves Pinto: novo livro de poesia
Posted by Linguagem de cálculo on domingo, 8 de maio de 2011 · Leave a Comment
O autor, Fernando Esteves Pinto, e a Temas Originais têm o prazer de o convidar a estar presente na sessão de lançamento do livro “O tempo que falta” a ter lugar no Auditório do Campo Grande, 56, em Lisboa, no próximo dia 21 de Maio, pelas 18:00. Obra e autor serão apresentados por Tiago Nené.
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1962 – Um dia miserável
A bandalheira do costume fazia a decoração da casa.
Eu era a menina na sua nudez de Klimt
exposta nas telas do chão.
Tapete de carne e gemidos,
como uma falsificação de mulher formosa
que sente destruir tudo o que em si já se perdeu.
A infância foi o meu pasto,
e eu segui as instruções que o veneno
dos meus dias organizava em doses puras
de descontracção e esquecimento.
Lembro-me do primeiro beijo e do amargo do bagaço.
Acho que me senti em glória quando me disseram
que a minha beleza nunca dormia,
e que o meu corpo ajudava a suportar a vida.
Agora sei que a mentira sempre cuspiu em cima de mim.
A mentira e o esperma.
Sementes de carícia em troca
da minha própria desgraça.
Fernando Esteves Pinto
in O Tempo que Falta
Temas Originais, 2011
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